Todo 4º domingo do mês é realizada em nossa paróquia a missa direcionada para as crianças. Neste dia cada comunidade se responsabiliza pela parte litúrgica e neste último final de semana, nós catequistas e catequizandos da comunidade matriz é que tivemos o privilégio de realizar tão gratificante tarefa.
Ensaiamos com as crianças os cânticos da missa, e escolhemos as que iriam proclamar as leituras e fazer a preces, sendo que nossa turminha seria a que teria maior número de participantes, pois eles é que irão fazer a primeira comunhão no início do próximo ano. Tivemos o cuidado de mandar um lembrete para os pais a fim de que levassem os filhos para a celebração.
Claro que sabíamos que um grande número de crianças não compareceria, pois seus pais não têm o costume de freqüentar a missa, e por conseqüência, não se dedicam a nossa igreja.
Confesso que em casa temos uma grande dificuldade para levar nossas duas filhas a missa dominical, mas somos insistentes e procuramos mostrar a elas que fazemos aquilo por amor, e por gostar de estar em comunidade. Na verdade, desde pequeninas que elas vão para a igreja, pois estamos acostumados a participar dos nossos serviços e elas nos acompanham desde que estavam no colo. Recordo que quando elas começaram a dar os seus primeiros passos costumavam andar dentro da igreja e todos já as conheciam.
Um certo dia elas me disseram que não queriam ir para a missa, pois todo dia era a mesma coisa e que o padre só vivia repetindo. Achamos melhor não explicar muito e queremos mostrar a ela que cada dia é um novo encontro, uma oportunidade nova de receber a palavra de Deus, de receber Jesus na eucaristia e de estarmos em comunhão com nossos irmãos.
Quanto a pouca participação dos catequizandos na missa, penso que a culpa maior é da própria família. E nós catequistas temos a nossa parcela de culpa, pois não estamos dando a estas famílias a assistência necessária. O ideal seria que a catequese, a pastoral familiar e a família pudessem trabalhar em conjunto para mudar este quadro.
Segue um texto do Padre Fábio de Melo e que nós servirá para refletir sobre esta questão.
Quando a missa se torna uma obrigação...
Religião é uma forma de religar. Religa partes, une pontas e diminui distâncias. O sacramento está sempre unido a um símbolo justamente por isso, pois ele é uma forma de concretizar a natureza da religião. Ele é a parte humana que se estende em direção a Deus com o intuito de tocá-lo e experimentá-lo. O símbolo é uma forma de prazer e o sacramento também, pois nele o sacrifício está redimensionado, já tem cores de ressurreição.
A pergunta
O menino chegou e perguntou-me: "Padre, eu sou obrigado ir à missa?". Olhei seus olhos e percebi uma honestidade na questão formulada. Junto da honestidade, havia uma ansiedade que lhe impedia o sorriso. No rosto, não havia alegria. Estava tomado de uma certeza de que a liturgia católica, para ele, estava longe de ser um acontecimento que lhe extraia gratuidade. Era uma obrigação a ser cumprida.
Sua voz parecia me pedir socorro, feito escravo com sua carta de alforria em mãos, a me pedir assinatura.
Naquele momento, fiquei sem palavras. Senti o coração apertado no peito e o desejo de nada responder. Reportei-me à Escritura Sagrada e senti-me como o próprio Abraão, diante do questionamento de Isaac: "Pai, onde está a vítima do sacrifício?" (Gn 22, 7). Pergunta que não tem resposta. Pergunta cheia de ansiedade, de silêncio, de motivos, honesta e plena de razões.
Olhei-o com muita firmeza e resolvi desafiá-lo: "É obrigado visitar alguém a quem se ama?". Ele disse: "Não, não é não, padre". Seguiu-se o silêncio. Calou-se ele, e eu também.
A pergunta que não cala
Algumas horas depois, retomei sua pergunta e fiquei pensando nela. Coloquei-me a pensar na religião que se apresenta ao coração humano como obrigação a se cumprir, feito mochila pesada que se leva nas costas.
Fico pensando no quanto a obrigação pode se opor ao prazer. E o quanto é contraditório fazer a religião ser o local da obrigação. Na expressão: "Deus é amor" (1Jo 4, 8), definição que João nos apresenta em sua carta, está a declaração da gratuidade de Deus.
Deus é o próprio ato de amar. Ele é o amor acontecendo, e a liturgia é a atualização dessa verdade na vida das pessoas. Ir à missa é tomar posse da parte que nos cabe.
Tudo o que ali se celebra e se realiza tem o único objetivo de nos lembrar que há um Deus que se importa conosco, que nos ama e quer nos ver mais de perto. O sacramento nos aproxima de Deus.
Tudo bem, essa é a Teologia, mas e a vida, corresponde à verdade teológica?
Nem sempre. Nosso rito, por vezes, cansa mais do que descansa. É lamentável que a declaração de amor de Deus por nós tenha se tornado uma obrigação.
Sou obrigado a ouvir alguém dizer que me ama?
Se muita gente pensa assim, é porque não temos conseguido "amorizar" a celebração. Racionalizamos o recado de Deus e o reduzimos a uma informação fria e calculada. Dizemos: "Deus nos ama!", da mesma forma como informamos: "A cantina estará funcionando depois da missa!".
A resposta que responde perguntando
Pudera eu ter uma solução! Ou quem sabe uma resposta que aliviasse os corações que se sentem obrigados a conhecer o amor de Deus, como o coração daquele menino.
Talvez, o teu coração também já tenha experimentado essa angústia e essa ansiedade. Gostaria de saber restituir o sabor lúdico das celebrações católicas. Torná-las acontecimentos reveladores, palavras para não serem esquecidas e imagens que despertassem o coração humano para o desejo de descansar ali todas as questões existenciais que o perturbam.
O problema não está no conteúdo do que celebramos, mas, sim, na forma.
A natureza simbólica da vida é o lugar do encanto. Por isso, a celebração é cheia de símbolos. Mas o símbolo, se explicado, deixa de ser símbolo, perde a graça e deixa de comunicar. Talvez seja isso o que tem acontecido conosco. Na ansiedade de sermos eficientes, tornamos a celebração um local de comunicar recados. Falamos, falamos, de maneira ansiosa, cansada e repetitiva. Temos que falar algo, pois também o padre tem a sua obrigação!
E assim vamos celebrando, obrigando o coração e os sentidos a uma espécie de ritual que nos alivia a consciência, mas não nos alivia a existência.
A missa é muito mais do que uma obrigação: é um encontro. Encontro de partes que se amam e se complementam. É só abrir os olhos e perceber!
Creio que possa ser diferente.
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